sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

Alguém disposto

Para toda amargura
existe uma boca
doce,
pronta para adoçar
a vida.
Para todo coração machucado,
existe alguém disposto
a te libertar do passado,
existe alguém que não se importa
com o que houve,
alguém disposto
a se importar apenas com o que virá
a partir dos dois.
Para toda chuva,
existe um sol aguardando
para fazer a sua parte depois.
O escuro se torna claro,
o vazio se torna exato,
o completo se torna repleto
de toda a felicidade possível,
e de todos os sonhos impossíveis,
há alguém disposto a fazer valer.
Alguém pronto para te ver crescer
e só interferir nisso para colaborar.

Helena Vicente

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

9,8 m/s²

De vez em quando a gravidade não parece ser
suficiente
para nos segurar.
A gente flutua, flutua por aí
tentando se encontrar,
tentando permanecer em algum lugar.
Tentando pertencer a alguma coisa.
É difícil se esgueirar
de tudo que machuca na atmosfera.
É difícil se segurar,
manter a calma e se deixar levar.
A gravidade parece, às vezes, não funcionar.
O corpo pode estar fixado,
mas a mente nunca está no mesmo lugar.
Parece que estamos sempre devendo,
sempre em dívida
com nós mesmos,
parece que as expectativas não acompanham
o ritmo, os motivos, as mudanças.
É complicado viver entre as pressões do mundo
e a gravidade que não faz fixar.
Flutuamos, flutuamos por aí,
entre o que devemos fazer e o que conseguimos.
Entre o que queríamos e o que fica pra depois,
entre uma palavra e outra,
é difícil acompanhar.

Helena Vicente

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Castelo de vidro

Os meus pensamentos 
trincam teu castelo de vidro
e ninguém tem controle sobre isso.
O mistério que existe
transparente e tão só,
posso ver por dentro dele,
mas não posso afirmar coisa alguma.
Se trinquei teu castelo, não foi por mal,
não foi por mal,
foi uma tentativa impulsiva 
na vontade de ver sobre ti mesmo,
na vontade de entender
o que consigo enxergar
dentro do teu castelo de vidro.
O que consigo ver 
é abstrato e tão só,
continuo sem poder afirmar coisa alguma.
Se trinquei teu castelo de vidro,
não foi por falta de cuidado,
eu só queria uma oportunidade de entrar.
Eu só queria e gostaria
de te ajudar a limpar os vidros
desse teu castelo tão frágil.
Queria te proteger da solidão 
que é morar dentro desse castelo
tão bonito e tão só.

Helena Vicente


quinta-feira, 6 de julho de 2017

Encontre motivos

Descubra uma razão para não chorar,
se alimente e pense no que ainda há,
pense em tudo com carinho
porque a raiva não vai facilitar.
Se encontre em outros corpos,
em outras janelas,
em outros depósitos de pensamento:
deposite o seu para modificar.
Não se deixe levar por tão pouco,
mesmo que pareça muito, de início.

Tudo tende ao vazio.

Descubra uma razão para se manter vivo,
para manter o pouco ainda colorido,
descubra uma razão para não se humilhar,
você precisa se amar em primeiro lugar.
O amor próprio não diminui,
não sofre alterações, se consolidado.
O amor próprio não é par do egoísmo,
nem da posse. 
Você deve se cuidar,
ninguém pode fazer isso por você.
Tudo que vem, vai também
e você fica, e fica só, consigo mesmo.
Não deixe que levem-o para garantir o bem estar,
você não é remédio, nem objeto.
Você precisa do recíproco para não adoecer.

Onde não há reciprocidade, não se faça permanecer.

Ninguém pode lhe curar, a não ser você.
Ninguém pode remendar o que foi rasgado,
se você não permitir. 
Para curar, precisa doer,
mas o processo se alonga se você mexer na ferida,
entretanto isso te fará mais forte
para aguentar qualquer outro fim.
Aos poucos tudo se põe no lugar,
mas isso não quer dizer que o lugar é sempre o mesmo,
você já não é mais o mesmo,
tampouco a forma como você organiza seus motivos.
O que antes você julgava essencial,
hoje já não parece mais tão importante,
pelo contrário, parece banal.
Você já não gasta tanta energia
com as futilidades do dia a dia.

Poupe a sua energia emocional.

Se permita observar o que é novo,
dê oportunidades para o acaso,
esteja aberto às surpresas,
mas mantenha os pés no chão
e os olhos bem abertos,
e acredite que tudo acontece por uma razão,
para facilitar sua compreensão
acerca das coisas que não parecem fazer sentido.
Acima de tudo: viva
e se deixe viver tudo que a vida te propõe.
Sinta o gosto, sinta o cheiro,
aprecie o sabor, mesmo que amargo,
intensifique o natural.

Não seja contaminado pela monotonia.



Helena Vicente

segunda-feira, 12 de junho de 2017

Padrão

A nossa criatividade,
dia a dia é mais sufocada.
Uma ideia fantástica
que não se encaixa nos padrões.
Tentamos moldar nossa criatividade
até que ela caiba no contexto,
e o que antes era inovador,
passa a ser só mais uma sequência
do padrão tedioso das empresas,
da faculdade,
dos ambientes cheio de regras,
torna-se o padrão do que é bonito,
sem essência,
sem originalidade,
porque o novo surpreende,
e nem todos observam de verdade.
De início é esquisito,
é diferente,
e não há profundidade no olhar,
apenas esquivas.
A vontade de também ser diferente
é representada pelos julgamentos,
pois quando a gente reprime,
tentamos ficar o mais longe possível
para não se deixar levar
e ser criticado também.
"O que os outros vão pensar?"
Há discordância para se destacar,
é muito importante estar dentro do padrão
para não sobrar,
para não ficar junto dos que inovam,
dos que são julgados pelos olhares pequenos,
dos que causam estranheza ao expressar
tudo aquilo que é preso 
pelo medo de mudar.
Há uma imensa vontade de estereotipar tudo,
o ser humano, o ser social sente a necessidade
de rotular tudo que é diferente,
pois precisa estar no controle,
precisa dizer o que é, como é e por que é de tal forma,
para assim discriminar, se opor,
para propagar o que é padrão e como deve ser.
O ser humano, o ser social precisa entender
que na verdade, não precisa entender nada,
que muitas vezes só o sentir, basta.
Precisa saber que as coisas são como são,
são por que são e são porque é necessário.
O padrão deveria mostrar que há lugar para todo mundo,
e que ninguém precisa humilhar ninguém 
para ser maior. 



Helena Vicente

sexta-feira, 2 de junho de 2017

Qualquer coisa

Eu não sou essa qualquer coisa
dessa qualquer rua
que tu de repente, se flagrou
eu não sou qualquer coisa
dessa sua qualquer vida
com que saída 
eu fujo de ti?
eu não sou qualquer coisa
que esbarrou
na sua lembrança,
eu não sou qualquer lembrança,
eu jamais saírei daqui.
eu não sou qualquer coisa
que você não faz qualquer esforço
pra me ver sumir,
você não percebe
mas não sou essa qualquer coisa
que eclodiu em ti.
eu não sou qualquer coisa
objeto quebrado
de qualquer chão,
em qualquer casa,
eu não me parti.
eu não sou qualquer coisa
que o céu lançou na terra,
não sou divina,
tampouco santa.
Mas eu não sou essa qualquer coisa
que fica em qualquer canto
em busca de carinho.
Eu não sou um passarinho,
tampouco livre pra cantar.
Eu não sou essa qualquer coisa,
que você não se permite amar.
Só me diga qualquer coisa
que não seja tão pequena,
não precisa ser poema,
só me perceba como grande.
Só me perceba,
e além disso,
proteja-me do qualquer.


Helena Vicente

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Aroma de primavera

Eu quero que meu corpo consiga
Comportar uma flor e uma alma,
Que consiga abrigar um corpo
No leito da minha afeição.
Quero que meu corpo
Traga poesia e seja poema,
Que todos os jardins lembrem de mim
Que já fui flor,
Agora sou amor
E estou sempre pronta para amar.
Eu quero que meu corpo
Seja a imagem da minha alma,
E que ninguém possa me tocar
Sem antes ser alma também.
Eu quero encontrar uma alma
Que saiba amar
E que já tenha sido flor
No jardim que me encantou.

Helena Vicente

quinta-feira, 6 de abril de 2017

Na sociedade

Eu não posso negar o Outro
que tanto se aproxima de mim,
eu não posso ignorar o Outro
que tem tantos desejos afins,
não posso expulsar o Outro
que tem direitos como a mim,
não posso dominar o Outro,
se ele pertence a ele mesmo, enfim.
O Outro não pode controlar a mim,
se eu sou dona de tudo que possuo,
o Outro não pode me diminuir,
se nós acabamos sendo iguais, por fim.
O Outro não é o Outro
antes de ser igual a mim.
Eu não sou apenas eu,
se vivo no meio de tantos Outros.
O Outro se camufla em mim, 
e torna-se ''nós'', 
o Outro sou eu precisando de paz,
o Outro sou eu precisando de segurança,
Eu sou o Outro 
e nós precisamos de igualdade,
Eu sou o Outro
e nós precisamos de esperança.

Helena Vicente

terça-feira, 7 de março de 2017

A mais conhecida

Ela me toma com as garras,
envolve-me pelo pescoço,
pressiona-me contra a parede
e ergue-me com força.
Rindo do meu desespero
ela pergunta quando é que vou me acostumar,
enquanto estou a debater-me
a fim de fugir e ficar sozinha
com medo dela voltar.
Ela não sente pena,
empatia,
compaixão,
para ela isso é hobbie
e também necessário,
pensa ela que eu necessito da sua presença
para poder seguir adiante, atrás de alguma coisa,
mas tentei explicar a ela
que as suas visitas só me fazem mal,
me tornam improdutiva,
me tornam cansada,
enjoada e doente.
Ela não entende,
e eu não sei como fazer
para deixar claro de uma vez
que não preciso dela pra viver,
que ela me faz morrer,
mas ela não quer entender.
Nunca avisa quando vem,
só chega arrebentando todo tipo de equilíbrio,
que com custo consegui manter,
ela chega destruindo tudo,
me coloca numa cama,
impossibilitada de vencer,
e fica na minha mente gritando
"VOCÊ TEM MUITO AINDA QUE FAZER"
- Mas eu não consigo, sinto-me doente
E sinto então aquele velho frio na barriga,
e depois a tristeza que o sentimento de inutilidade traz consigo.
No meu quarto, escuro,
eu não quero pensar em nada,
mas eu penso em tudo.

Helena Vicente

domingo, 5 de março de 2017

Agradecer

Se conseguimos levantar pela manhã
tomar um café, mesmo com pressa,
se conseguimos ouvir os pássaros
e seguir nosso trajeto rotineiro,
já é algo que devemos agradecer.
Nem tudo nos inspira,
e nem sempre o que nos inspira,
causa algum impacto criativo na nossa mente.
É preciso ter paciência,
e esperar.
É preciso ter força pra seguir em frente
e ter coragem pra não reclamar,
ter gratidão pra agradecer o que temos
e esperança para persistir em nossos sonhos.
É preciso ter paciência para não desmoronar,
para não gritar de saudade ao sentir aquele cheiro,
para não pegar o telefone e colocar tudo a perder.
É preciso dar um tempo
para pensar e refletir,
seria bom se todos os dias,
parassemos por um momento
para analisar nós mesmos e as nossas atitudes,
e com isso, tentar ser melhor a cada dia.
Todos têm um bloquinho de experiência,
nem sempre boas,
nem sempre ruins,
e que todos possam refletir sobre
''o que eu sou''
''o que eu fui''
e se orgulhar.

Helena Vicente


segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Inferno particular

Ninguém precisa frequentar
O meu inferno particular.
Carrego comigo os meus monstros
Para todo lugar que eu vá,
Eles me assombram,
Me fazem surtar.
Por vezes me controlam
E me fazem perder o controle de mim,
Eles tentam assombrar as pessoas a minha volta
E eu sempre tento impedi-los,
Só eu sei o quanto é ruim
O efeito que eles causam,
Mas não consigo conte-los sempre
E eles acabam sugando terceiros
E me deixando pior ainda.
Eles são fortes demais
E ganham força quando me sinto vulnerável,
Ninguém sabe o quanto me esforço
Pra conviver dentro de mim,
Mas como já falei, enfim
Ninguém precisa frequentar
O meu inferno particular.

Helena Vicente

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Ar

Que possamos lembrar sempre:
Depois do fim, só existe recomeço
E que a vida tende a te virar do avesso
E isso é o que molda tua essência,
Mesmo lhe tirando a inocência,
Te blinda pra não sofrer mais tarde.
Nem sempre o que julgamos essencial
Significa que precisamos de fato,
A nossa vaidade não tem fronteira,
Às vezes precisamos parar pra respirar
E só nesse momento em que paramos
É que conseguimos pensar melhor.
Que possamos lembrar disso mais tarde,
Que a sabedoria fica escondida
Esperando o momento do silêncio
Para se mostrar,
E que o fim convida o novo,
E o ciclo faz repetir,
E para não cair é preciso respirar.

Helena Vicente

domingo, 22 de janeiro de 2017

Reciclar

Nem tudo é tão sujo assim
Nesse mundo
E enquanto eu puder escrever
E souber escrever,
Farei com que minha poesia,
Cure o mal, absorva a tristeza, ou
Exale tristeza
Para que ninguém se sinta tão sozinho
também.
Enquanto eu puder,
E ainda me for conveniente,
Eu quero escrever sobre amor,
Sobre paz e liberdade.
Eu quero escrever que aqui
Há igualdade,

Já basta para o mundo
O seu próprio mal.

Eu me protejo da intoxicação
Que esse mundo me causa,
Eu uso das letras,
Como se fossem remédios,
E prefiro fechar os olhos, às vezes
Para que a poesia continue me sendo
Suficiente.

Helena Vicente

IX

  Anelise era uma menina, digo uma menina pelo fato de estar no auge dos seus 16 e ser dona de uma ingenuidade gigantesca, carregada dentro do seu coração genuíno e expressada através dos seus olhos infantis. De segunda a sexta-feira frequentava a mesma parada de ônibus na esquina da sua casa, nada acontecia no local onde morava. Pegava o ônibus e se deslocava para a sua escola que ficava à 17km da sua casa. Numa quarta-feira qualquer, foi até a parada no mesmo horário e para o mesmo fim, lá aguardou sentada pelo seu ônibus amarelinho, pôs os fones no ouvido e relaxou, teria prova logo mais e escolhera não pensar sobre isso, pois pensar demais atrapalhava sua concentração e deixava-a ansiosa. Na escola tudo sempre igual, sentava-se no meio da classe, 4ª mesa a esquerda da janela, a professora de matemática já havia chegado e distribuído as provas, uma em cada classe, Anelise sentou-se, observou a prova, respirou fundo e começou com o que sabia. Terminou em 20 minutos e sentiu-se satisfeita, deu o seu melhor como sempre. No fim da aula a matéria era artes, da qual Anelise fazia muito gosto, e a professora solicitou a todos os alunos que levassem para a escola na aula seguinte alguns materiais para colagens. Anelise já se programou para comprar os materiais em questão. Durante a tarde, a mesma cena: Anelise na parada esperando o ônibus para ir à papelaria. Ao chegar dentro do ônibus, Anelise retira seu livro da mochila para ler enquanto seguia viagem, e que viagem... Levava cerca de 40 minutos para chegar ao centro da cidade, o que resultava em muitos capítulos concluídos de A Menina que Roubava Livros. Do seu lado, um rapaz sentou-se, Anelise conseguia ouvir a música que ele estava escutando através do fone de ouvido, mas não soube distinguir qual era, continuou a ler seu livro, agora um pouco menos concentrada. O rapaz tirou um dos fones e olhou para ela, Anelise continuou, um pouco envergonhada, até que o rapaz cumprimenta-a, Anelise gelou, respondeu cautelosamente, em seguida voltou para seu livro. Ele se apressou em perguntar se ela estava gostando do assunto tratado em seu livro, ela sorriu e disse que sim, na verdade poderia dizer que estava amando, mas preferiu apenas concordar, continuando o assunto ele falou que já havia lido e tinha adorado, em seguida avisou o motorista que queria descer, olhou para Anelise e disse "a gente se encontra por aí", ela assentiu. Fechou o livro após a saída do rapaz do qual não sabia o nome, estava extasiada pelo o ocorrido, não esperava conhecer alguém que gostasse tanto do mesmo livro que ela, acreditava que ele tinha pouco mais de 17 anos, um rapaz bonito, moreno e de grande sorriso, o que bastou para deixar Anelise com aquele sentimento de ''amor a primeira vista'' por bastante tempo. Anelise já havia se relacionado com um garoto antes, nada muito sério, durou poucas semanas, mas suficientes para fazê-la detestar o garoto com todas as forças, mas esse rapaz do ônibus era diferente, ela sentiu, percebeu que ele era inteligente e adorou sua simpatia. Chegou ao seu destino, comprou algumas revistas, tesoura e cola, mas o seu pensamento não era na aula de artes. 
Passou muito tempo, Anelise nunca mais vira o rapaz do ônibus, e de vez em quando até tentava encontrá-lo, pegando o mesmo transporte, no mesmo horário, mas isso foi deixando-a frustrada demais e ela resolveu esquecer, "que seja". Têm coisas que devemos aproveitar, guardar numa caixinha de lembrança e continuar, foi rápida a história que vivera, queria poder conhecê-lo melhor, mas conformou-se em guardar o sorriso do belo garoto nos seus pensamentos de menina.
Helena Vicente

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Dona do tempo

Eu sou dona da minha própria métrica
Da minha própria poesia
E do jeito de decidir as coisas como penso ser melhor
Eu sou dona dos meus passos,
Dona do meu cansaço
Coisa que prefiro não compartilhar com ninguém.
Ninguém nasceu pra viver de atraso,
Ainda mais quando já tem o próprio relógio bem adiantado.
Eu só faço continuar a pé,
Enquanto tu permaneces no barco
Eu torço para nenhuma onda te acertar.
Seguindo caminhando, buscando distração
O vento bate no meu rosto
E eu observo o quanto é bom estar em paz.
Dentro de mim há muito mais
Do que qualquer conceito mal elaborado
Sobre liberdade.
Não posso explicar porque não tenho tempo
E nem medo.
Eu não quero lhe assustar.

Helena Vicente