quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

O que te dizer agora que a poeira já baixou?
Eu vivia da sua voz ressonante, eu dependia dela pra dizer bem a verdade, mas agora tá tudo tão diferente.
Eu só sou uma pessoa incompleta e pensei que em ti encontraria a metade que faltava, mas o que posso encontrar em ti a não ser um mar de erros? Pensei bem nisso por dias, por noites e madrugadas intermináveis, pensei em ti o tempo todo nesses longos dias, achei que não encontraria algo melhor e pra ser sincera, não encontrei mesmo, mas eu percebi que eu só tinha a perder contigo.
Perdia minha sanidade, perdia o equilíbrio, perdia o meu orgulho.
Agora que te vejo de outro ângulo, percebo também que nem és tudo isso, você só é bom no que fazia comigo, isso eu admito, mas isso é tão vazio.

Helena Vicente

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Há tão pouco tempo.

Vamos sair.
Tomar uma taça de vinho-branco.
Praticar poesia.
Proclamar o nosso orgulho.
Vamos viver, há tão pouco tempo.
Vamos sair correndo e gritar nossas dores.
O mundo precisa saber o quanto fomos fortes.
O mundo precisa saber de nós.
Vamos dançar qualquer coisa que fizer um som.
Vamos implorar por mais um som.
Eu quero movimento.
Cansei da monotonia dos dias.
Somos tão jovens. 
Vamos brindar a nossa alegria
porque mesmo sendo momentânea, não deixa de ser alegria.
Vamos desorganizar o organizado.
Vamos desenhar bonecos de palito.
Porque não?
Temos tão pouco tempo.

Helena Vicente

Entra pra ver como você deixou o lugar.

Entra pra ver
como você deixou o lugar
E o tempo que levou pra arrumar
aquela gaveta
Entra pra ver
Mas tira o sapato pra entrar
cuidado que eu mudei de lugar
algumas certezas
pra não te magoar
Não tem porquê
Pra ajudar teu analista:
"Desculpa."
Mas se você quiser
alguém pra amar
ainda
Hoje não vai dar
Não vou estar
Te indico alguém
Mas fica um pouco mais
Que tal mais um café?
Ainda lembra disso?
Que bom
Mas se você quiser
alguém pra amar
ainda
Mas se você quiser
alguém pra anular
ainda
Desculpa, não vai dar
Não vou estar
Te indico alguém

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Seremos sempre o rascunho do destino, fazendo poesia, rasgando amor. Estou aqui tentando justificar erros, amenizar o desespero, usando palavras, ideias, e todo o meu vocabulário construído em milhares de viagens por livros (em vão) em um objetivo sem qualquer valor. Sou rascunho do nosso destino, porque, no final, quem tem preguiça passa a limpo tal como foi escrito e bem agora sou essa linha torta e solitária que se perdeu no papel encardido. Passa-nos a limpo, passa-me a limpo e diga-me que estava escrito, que esteve sempre escrito. Diga que apesar de todas as tentâncias e invenções abrasadoras, há algum fato nisso tudo que garanta que a magia não pode ser tão surreal a ponto de mudar esses erros. Amor, não existia corretivo naquele tempo, errei para que ficasse guardado no cosmos dessa utopia, está eternamente “errado”. Só queria ser o seu erro mais bonito, porque em tuas cartas senti a distância do verbo e mesmo assim insisti nos talvezes que, na verdade, nunca existiram. Traga-me o compasso.
"Aquela aquarela mudou
Na estrada peguei uma cor
Capaz de cair um toró
Estou me sentindo um jiló
Eu tenho tesão é no mar
Assim que o inverno passar
Bateu uma saudade de ti…"

Chico Buarque

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Em transe.
Um trânsito de paixões correndo o corpo.
Amores ridículos, plurais, amores de esquinas da vida e de ruas estranhas, cantos do peito, da boca, canto do quarto branco e vazio. Cobre de culpa os pelos do corpo e eriçam os pelos da nuca no menor toque de vontade crua. Qualquer barulho enlouquece, qualquer luz acusa as verdades que desconheço. Nunca achei um meio termo saudável, não consigo arrumar a bagunça de dentro, não consigo evitar a bagunça de fora, todos os erros agridem o rosto no dia seguinte.
A vida assusta. O medo é mau. O mundo é grande demais.
Mas há no peito a vontade maior ainda, e na boca, todos os dentes pra morder os dias direto no coração.
Nota: estava esperando o mundo acabar mas acabei voltando pra casa. Ressaca moral de domingo no meio da semana.


(Daniella Leal)

“Quando a chuva veio… Ah, quando a chuva veio eu quis contar as gotas que molhavam, as nuvens que caíam, os passos corridos que os transeuntes davam! Quando a chuva veio a alma quis lavar, gritar, sacudir o corpo inteiro. Quando a chuva veio isso parecia um sertão há 365 dias sem ver água, e não digo um ano, não: são 365 dias para sentir a secura de cada um, na saudade, na sobriedade, na raça e no peito. Parecia o feto apressado querendo conhecer o mundo, ninguém esperaria mais um segundo para abrir as portas e lavar a alma. Sabe-se lá que sujeira a vida fez, porque às vezes jogar sujo não é somente com as cartas em mãos. Quando choveu, aquela gente toda correu em desespero, uns queriam fugir, outros queriam encontrar. Eu era a estatura que na chuva só enferrujava, e mesmo assim corri. As nuvens não sabiam se riam ou se choravam. Nem eu sabia mais o que era riso e o que era choro. Felicidade e tristeza são vizinhas, vira a esquina é uma, vira de novo e é outra. Amigo, não tem placa de rua que salve esse encontro, essa mistura. Essa é a minha rua. E aqui a chuva se some por dias. A alma se contorce, o chuveiro mais próximo não serve. Não, eu não quero um pano molhado. Estou como está o sertão. Ele seca, todo o povo chora e o céu ignora. E é por isso, unicamente por isso, que quando a chuva veio, eu fui.”
 

Camila Costa


você pé no chão, eu aerovia.
quando eu minoria, você população.
quando você hindu, eu vacaria.
quando eu caligrafia, você computação.
e se você amputação, quem me abraçaria?


terça-feira, 15 de janeiro de 2013


Universo barato

"Começo a conhecer-me. Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo, porque também há vida …
Sou isso, enfim …
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato."
 
- Álvaro de Campo